Durante essa semana vi algumas publicações de mães que me
deixaram meio inquieta e até filosofando um tanto. Na verdade, li duas publicações
distintas de mulheres diferentes, em um grupo de mães "normais", ou
seja, um grupo de mães de todo tipo, dentre as quais uma minoria com filhos
alérgicos alimentares.
Primeira publicação: Uma moça fazia um alerta sobre um
produto que tinha acarretado um choque anafilático no filho de uma amiga dela.
O produto era este:
Assim que vi, olhei aquela caixa da foto que a tal mãe amiga da outra mãe postou, e além de triste pelo sofrimento da criança e sua família (pois sei o que passaram por vivência, meu filho teve uma anafilaxia aos 6 meses, em seu primeiro contato com o Nan), fiquei também abismada de como um acidente desse pode ainda acontecer por meramente uma má interpretação de um rótulo. Na verdade, neste caso, foi por uma não-leitura deste, pois estava ali bem explícito que aquele produto apenas não tinha LACTOSE, mas tinha sim, proteína do leite, onde grifo na foto e reescrevo para uma melhor leitura: Contém soro do Leite, ou seja, muitas proteínas... E ele avisa isso abaixo de "para dietas com restrição de lactose", ou seja, a embalagem não mentiu, nem omitiu, e ainda está em conformidade com a legislação vigente.
Totalmente compreensível que esta moça, amiga da mãe, não tenha o conhecimento sobre alergia alimentar, intolerância, proteína do leite, lactose... o que é difícil compreender é que a mãe de uma criança assim, ainda por cima mediada por igE (risco maior de morte) não saiba.
Continuando, na mesma semana, por acaso, vi a segunda publicação neste mesmo grupo, onde uma mãe pedia sugestões de determinado produto para a filha aplv. Foi quando uma outra mãe aconselhou fazer este produto em casa, usando como matéria prima, acreditem, mais uma vez, o tal do leite sem lactose "Piracanjuba", pois o filho dela consumia sem problemas, mesmo ele sendo aplv, inclusive alimentado pela fórmula especial hipoalergênica de determinado leite hidrolisado.
Nesse momento, como diz a outra, Morri! Eu nunca tinha escutado bulhufas sobre piracanjuba. E numa só semana, vejo aquele bendito (por alguns, maldito) num mesmo grupo de uma rede social. Mas fiquei refletindo muito sobre isso, e até comentei no Tips (grupo aplv) abrindo o debate sobre "A culpa é de quem?"
Da Mãe, que não aprendeu que "Zero Lactose" é igual a "Sou leite mesmo assim"?
Dos Médicos, que não a orientaram adequadamente?
Do Sistema, que não viabiliza acompanhamento multidiciplinar?
Da Legislação, que não obriga informação de alerta para alérgicos?
Das Indústrias, pela falta de sensibilidade e responsabilidade social antecipando-se às normas?
Talvez o conjunto de tudo isso né...um círculo vicioso de ações e consequências: família que não busca informação + profissionais que não orientam + escassez de especialistas capacitados + legislação falha + indústria que só visa o lucro antes do ser humano consumidor.
Enfim, fiquei sabendo que eu era a "última a saber" que esse mesmo Piracanjuba já tinha ocasionado inúmeros acidentes e usos por aplv em todo o Brasil, a ponto da empresa se comprometer a reeditar sua embalagem.
Mas resolvi tomar uma atitude para ajudar de alguma forma, tímida, porém a que posso no momento. Pensei em desenhar de forma didática o que tem dentro do Leite de Vaca, deixando mais claro para um leigo (assim como eu, que não entende nem faz parte da área química) o que seria essa lactose e essa proteína, e porque uma não está contida na outra e vice versa. Para isso, acabei estudando um pouquinho, via-google mesmo, mas nem por isso, menos válido. Aprendi muito, adorei! E a seguir, compartilho com vocês as informações relevantes ao tema e os desenhos que produzi, afinal, desenhando a gente entende! rs
Não vou me ater sobre o que é a proteína, até porque teria medo de errar. Mas o que sei é que Proteína são vários aminoácidos coladinhos um no outro. Assimilei isso com facilidade fazendo a famosa analogia do colar de pérolas. Pra quem não sabe, é o seguinte:
- Colar de pérolas = Proteína
- Trecho quebrado do colar onde restam algumas pedras ainda amarradas = peptídio
- Pedra de pérola solta e isolada = aminoácido
Então, recapitulando, proteína é uma cadeia de vários aminoácidos. A proteína Caseína, por exemplo, tem uma conformação própria, a Alfa-lacto outra conformação e por aí vai. Saber disso, é fundamental para entendermos como o organismo reconhece cada proteína.
Na digestão, as proteínas precisam ser quebradas, e um organismo normal faz isso sem dificuldades. Já o alérgico, não. Por esta razão, algumas crianças aplv só podem consumir leite especial. Algumas se dão bem com leites hidrolisados (proteínas quebradas em peptídios), outras apenas com fórmula de aminoácidos (proteína totalmente quebrada, não há mais o que ser quebrado), mas tem também os leites vegetais (soja, arroz, aveia etc).
Até hoje só escutei falar sobre três tipos de proteínas do Leite, são elas: Caseina, Alfa-Lactoalbumina (apelide de alfa, o resto a gente sempre esquece) e Beta-lactoglobulina (por codinome, Beta). Mas algumas vezes escutei que existem nnn outras proteínas, inclusive peptídios capazes de provocar reação do sistema imunológico. Daí fui buscar quais proteínas são essas, e realmente, aquelas três são as mais perigosas, porque são as predominantes.
No gráfico, vemos a proporção entre as três no Leite de Vaca, onde 80% é constituída por Caseína, 16% pela Beta, 4% pela alfa e as demais em percentual muitíssimo pequeno (valores retirados do Site www.pratiqueleite.com.br):
A título de curiosidade, no leite humano há apenas cerca de 25% de Caseína (Wikipédia), e as demais proteínas existentes no leite humano são: alfa-lactoalbumina, lactoferrina, lisozima,
imunoglobulinas IgA, IgG e IgM e albumina sérica. Interessante, que a beta-lactoglobina presente no
leite de vaca encontra-se totalmente ausente no Leite Materno (Sociedade
Brasileira de Nutrição Parenteral e Enteral-SBNPE). Resumindo, no leite materno, há menos Caseina e não há nada da "Beta", motivo pelo qual concluo que nunca meu filho reagiria ao meu leite, sendo ele negativo para Caseina e "Alfa", e positivo apenas para "Beta".
Mas lendo essa informação, fiquei lembrando de todas as crianças que conheci mediadas para caseina e Alfa, mas que mamavam do leite materno sem prejuízo a saúde. E me perguntei: Porque o leite materno não faz mal a
alérgicos às proteinas caseina e alfa-lactoalbumina, já que estão presentes
neste também? Foi quando li na mesma publicação da SBNPE o seguinte: Há
diferenças físico-químicas entre a caseína bovina e humana que levam à formação
de coalhos com características diferentes. O coalho do LM é bem mais fino e de
melhor digestibilidade. O alto teor de caseína do LV favorece a ligação
caseína-cálcio, formando sabões insolúveis, prejudicando a absorção desse
mineral33. Lindo isso né? :D
Entendendo bem sobre a Proteína, vamos ao gráfico mais legal e esperado: O que é que tem no Leite do Nenê? (Dados retirados do site do Instituto Catarinense de Educação-ICEU):
A proporção de água é gritante, mais de 80%. Os 20% que sobram, a maioria é carboidrato, constituído na forma de Lactose, e os demais, constituem as proteínas, gorduras, minerais e vitaminas.
Outra coisa interessante que descobri no site do ICEU é que a nata que se forma no leite, nada mais é que gordura. Ela sobe para a superfície do recipiente quando o leite está em repouso, em especial, refrigerado. Com isso, lembrei de um dos acidentes de percurso que tivemos com meu filho. Em uma viagem para o sítio de nossos parentes, ele abriu a geladeira sem que percebêssemos. Como toda casa de fazenda, encontrou uma panela de leite a sua frente e não exitou em pôr o dedo e levá-lo a boca. Foi o momento em que o flagramos: o dedinho saindo da panela e indo para seus lábios. Foi uma correria agoniada, estávamos prontos para um segundo choque de anafilaxia. Mas não tivemos nem sequer um bigodinho vermelho. A panela estava coberta de Nata, e ele não deve ter passado dali. Como era só gordura (o frio da geladeira intensificou essa separação) e ele já mais resistente (tinha mais de 2 anos já), não tivemos problemas, graças a Deus.
Eu ainda não estava entendendo bem qual a relação entre
carboidrato e açúcar. Em minha leiguice, eu achava que eles estavam associados de alguma forma, mas eu achava que o açúcar era um processo de transformação do carboidrato. Mais uma vez, Sr. Google me explicou, e se eu estiver errada, por favor, me corrijam. Em uma publicação
de Timothy Gower, ele explica que os Carboidratos se classificam em três
categorias: os Amidos (ricamente existentes na Batata, pão, massa, arroz), as
Fibras e os Açúcares.
Os açúcares podem ser: Sacarose (encontrada no açúcar proveniente
da cana e de algumas frutas e verduras), a Frutose (encontrada em frutas e
no mel) e, finalmente, a Lactose (encontrada no leite), entre outras.
Sendo assim, a Lactose, nada mais é que um açúcar lácteo que
confere ao leite, seja o de vaca ou o humano, o seu sabor adocicado.
Agora posso mostrar um outro gráfico, onde poderemos comparar aquele dos componentes do leite de vaca com os componentes que existem dentro daquela caixinha do "Piracanjuba":
Percebem? O Piracanjuba é igual ao leite de vaca que voce compra na mercearia, tem tudo MENOS a lactose. Restou alguma dúvida? Espero ter ajudado, pelo menos alguma mãe ou pai ou tia...espero ter assim, quem sabe, evitado um futuro choque de anafilaxia, ou uma complicação gástrica, um refluxo, um agravo no desenvolvimento do seu filho.
Beijos e bons ventos nos tragam conquistas! "Põe no rótulo" em letras garrafais, que o povo possa ler antes do "zero lactose". "Põe no rótulo" em todos os produtos inofensivos para uns, venenosos para outros. #poenorotulo
EDIÇÃO POSTERIOR: NO PIRACANJUBA TEM SIM LACTOSE, NO ENTANTO, TEM A ENZIMA LACTASE QUE A INIBE... corrijo agora meu erro, aprendi isso depois de ter escrito essa publicação. Quando temos um iogurte de leite de vaca, ou o próprio leite, e na embalagem lemos "Sem Lactose", na verdade, ele tem sim, no entanto vem junto essa enzima que anula os efeitos nocivos ao intolerante.
