domingo, 16 de março de 2014

A Caminho da sonhada Inclusão Escolar...

Depois de 5 dias de redação, finalmente consegui fechar essa publicação no Blog, como não poderia deixar de ser, pronunciar um fato muito feliz para inclusão escolar aqui em Fortaleza. Mas vou contar esta saga desde o começo, até para servir de documento histórico, afinal realmente estamos escrevendo História não apenas nessa cidade, mas no país (lembremos também da repercussão do movimento #poenorotulo).

Em fevereiro de 2010 foi criado o primeiro grupo de mães de aplv de Fortaleza na rede social Orkut, a comunidade Meu Filho tem Aplv. Começei como integrante em novembro daquele mesmo ano, iniciando minha carreira de "internauta por uma boa causa". Mal sabia que os outros Estados também articulavam grupos até maiores, destaco aqui o trabalho da Vivi Correia no seu Blog Malu contra a Alergia Alimentar, que serviu como apoio inicial de muitas mães pós-diagnóstico (inclusive eu) naqueles tempos quando dificilmente ouvíamos alguém falar em alergia ao leite. Passado um tempo tivemos aquela baixa de acesso ao Orkut em favorecimento ao Facebook, que começou a ganhar uma explosão de adeptos, quando os grupos todos começaram a "migrar para" ou "nascer na" nova rede virtual: Amigas da Alergia, Tips4Aplv, Meu filho tem Alergia Alimentar, Alergias e Intolerâncias Alimentares, Mães na luta contra Alergia Alimentar e uma infinidade de tantos outros.

Em todos eles, mães procuram e encontram o apoio recusado (na maioria das vezes) pela sociedade, pela indústria e serviços e até mesmo pela família. Lá, normalmente, não se fala das grandes problemáticas mundiais, de política geral, de meio ambiente, economia, e demais atualidades noticiadas nos destaques jornalísticos (e até se fala, por consequência), e com muitas de nós realmente, e infelizmente, não nos sobra tempo de olhar para o macro, porque Alergia Alimentar nos consome 24 horas por dia, sem direito a férias, fim de semana, fim de expediente... 


Por todos esses anos que venho acompanhando outras mães via internet, tenho visto histórias parecidas com a minha, experiências felizes ou não, que nos ajudam a optar por caminhos melhores. Diante da vasta gama de profissões ali contidas, aprendemos sobre medicina, higiene, biologia, química, nutrição, psicologia, culinária... aprendemos a reconhecer não apenas sintomas confusos até mesmo para os profissionais da saúde, como também a reconhecer que somos fracas sozinhas e fortes quando unidas. E tendo consciência que até mesmo aqui, nos fragilizamos pela desunião nas incompatibilidades de personalidade, percebo que predomina a vontade de "fazer junto", de unir forças, e quando isso acontece em prol de um objetivo focado, geralmente temos êxito. E foi essa a razão de vitórias já conquistadas até aqui, como por exemplo, a primeira resolução jurídica na história desse país a abordar inclusão escolar de crianças com restrição alimentar, aprovada pelo Conselho de Educação de Fortaleza, neste dia 12 de março. 


Como tudo começou?


Antes de mais nada, quero lembrar que não faz parte do meu perfil bajular ninguém, certo? Não é de mim...antes fosse! Assim quem sabe eu tivesse mais "amigos" ou ao menos uma folha de pagamento todo final de mês (risos!). Quando um dia você ouvir alguma declaração de afeto minha, pode ter certeza, é porque gosto meeeesmo... e se vou falar dos feitos de alguém ou citar partidos políticos, é porque eu seria injusta de contar essa história sem os denominar. Não tenho intensão política, não estou lucrando absolutamente nada, nem entendo dessas jogatinas do meio. No entanto, uma das coisas mais tristes que vejo é a falta de reconhecimento. Por isso estou aqui "dando nome aos bois" sim, em alguns momentos. Se omitir alguém ou algum fato, é por que realmente algumas partes são mais sensatas serem omitidas.


Aqui em Fortaleza, em meados de 2013, recebi uma mensagem da amiga Fabienne perguntando se eu podia participar de uma reunião com o Renato Roseno (PSol-Ce) para falar sobre alergia alimentar. Fui sem saber direito "a que" e "quem" iria encontrar, mas fui pelo "porque"...falar com um representante político (que por acaso tinha sido minha opção nas últimas eleições para prefeito de Fortaleza) "porque" seria uma oportunidade de diálogo sobre alergia alimentar, fato exótico e que minha consciência realmente não admitiria perder. Lá conheci uma pessoa: Aline Saraiva (também conhecida como "Aline do leite" :) ), e desde então, esta tem sido verdadeiramente uma peça importante na história que tento contar. Pelo que soube em nossas raras conversas sobre "assuntos outros", ela teve uma militância política ainda quando estudante, divorciada ainda antes do parto, criou 
o Enzo apesar da força de todas as dificuldades. Além de ser um menino adorável e inteligente, quis o destino que este pequeno fosse também alérgico à proteínas do leite, da soja, do ovo entre outras mais...com familiares e amigos médicos e políticos, enraizou-se facilmente neste meio, conquistando aliados importantes não apenas no PSol, mas comunicando-se com facilidade entre representantes do governo e da oposição. E pelo que percebi, esse tal destino entregou finalmente uma bandeira para Aline chamar de sua, e graças a Deus essa era exatamente a mesma minha, da Thici, da Ana Roberta, da Tatiara, da Daniara, da Cecilia, da Inês, da Ineide, das Marias...e tantas e tantas que a tanto tempo choram sozinhas em casa sem saber, sem sonhar que existia algo mais eficiente que apenas falar alto com diretores de escola, atendimentos de empresas, funcionários de hospitais... 


Voltando a conversa com Renato Roseno (diga-se de passagem, um ser humano admirável e comprometido), estávamos lá: o próprio, a Aline, eu e outra mãe que conheci, a Ineide. Descobri que o teor da reunião era debater sobre o desorganizado atendimento (até então) no programa da fórmula alimentar especial (o Neocate), incluindo-se aí a estrutura do Hospital Albert Sabin, os procedimentos e métodos de atendimento pelos profissionais, o descaso pelo poder público, burocracia, entre outros mais. 


A partir daí, tive o conhecimento que o Roseno, na verdade, tinha entrado nessa história já por intermédio de outra grande figura do mesmo partido, a então vereadora Toinha Rocha, cujo assessor jurídico Rodrigo de Medeiros era amigo íntimo da Aline. Só então comecei a encaixar aquela inusitada aparição na minha pacata vida, quando também pude assistir um vídeo gravado pela equipe desta mesma vereadora, onde foi realizada uma "blitz cidadã" no hospital onde as crianças atendidas pelo programa do leite são assistidas. (Assista o vídeo AQUI)


Recomendo demais que vejam esse vídeo, e entendam o que eu senti quando vi Toinha Rocha realmente abraçando a nossa causa, como uma mãe de todas nós, com todas aquelas características peculiares de garras, de peito, de voz, de tiro no olho. Foi o suficiente para me encher de esperanças e voltar aos grupos do facebook (na época, eu estava em um dos tantos períodos de greve de internet), e fiz a ponte entre as moderadoras do grupo AIA e demais integrantes. Idealizamos uma associação (pois a Apaace, na época estava desativada e inacessível aos nossos anseios, pois precisávamos nos impor como uma entidade jurídica devidamente formalizada) e até iniciamos algumas reuniões e uma oferta de cede (Roseno nos disponibilizou a estrutura física do Cedeca-Centro de Defesa da Criança e do Adolescente do Ceará). O corpo inicial integrante éramos: Eu, Aline Saraiva, Thiciana Bezerra, Ana Roberta , Tatiara Monção, Tássia Leitão, Sued Mara e o Rodrigo de Medeiros sempre como nosso conselheiro e assessor jurídico. 


A partir de então, sucederam-se tantos novos eventos dentre os quais, uma audiência na Promotoria de Justiça de Defesa da Saúde Pública presidida pela Dra. Isabel Porto, incentivada por um problema momentâneo (mas recorrente) na distribuição do leite. Saímos de lá com o comprometimento de regularização e a garantia de que o governo ampliaria a idade máxima para fornecimento do mesmo, de dois para três anos de idade da criança (Naquela época, eu acreditava que minha filha já estivesse curada, mal sabia que, por conta desta conquista, hoje ela continuaria recebendo seu alimento, mesmo tendo mais de 2 anos).

Outra data importante foi a Audiência Pública realizada na Câmara Municipal de Fortaleza, no dia 19 de abril de 2013, onde o tema era "Necessidades Fundamentais das Crianças com Alergia Alimentar" (link AQUI). Foi um dia memorável, contando com a participação de familiares, representantes de órgãos ligados ao Programa do Leite, representante da Sociedade Cearense de Pediatria, políticos entre outros. (Algumas das mães presentes tiveram a oportunidade de se pronunciarem, AQUI a minha participação.)


Mas o intento de tornar o grupo AIA uma entidade não vingou. Mais uma vez vi a formação de uma associação cair por terra, por razões muito parecidas. A parceria se quebrou mas eu, particularmente, nunca deixei de acreditar que algumas conquistas viriam pelas mãos daquela força política de Aline, e continuei disponível na parte que me cabia, e sempre que solicitada. Minhas contribuições  se resumem aos 5 anos de experiencias de vida, à bagagem imposta e acolhida, a minha formação de arquiteta e urbanista que me muniu de conhecimentos de planos e projetos, com o que posso, com a vontade que tenho de fazer minha parte e tenho seguido essa linha de acrescentar nos diálogos que Aline consegue atrevidamente travar com o poder público.


Creio que a Audiência Pública seguinte, também na câmara e de autoria da mesma vereadora (Toinha Rocha, sempre ao lado do também vereador João Alfredo), que aconteceu no dia 03 de dezembro de 2013, com o tema "Inclusão de Crianças com Alergias Alimentares em Escolas Públicas e Particulares", foi um grande marco nas conquistas subsequentes. Mas dessa eu não participei, ao menos de corpo presente. O que fiz foi abrir um grupo para diálogo preparatório para a audiência, a pedido de Aline, no próprio Facebook, dois meses antes da Audiência ser marcada. O Nome era Grupo de Discussão sobre Alergia Alimentar e a intenção primeira era adicionar pessoas engajadas e experientes, mães de outros estados também. Reuni alguns bons documentos já existentes sobre o tema, abri discussões, expus experiências, tivemos muitas contribuições importantes, cada uma teve um valor edificante. 


Não sou programadora visual, mas o panfleto de divulgação fiz com carinho e por dias anteriores ao evento, ele rodou assim pelos perfis do Facebook:




E enfim, encerrei minha participação naquela preparação de Audiência com uma apresentação tosca do power point e que graças a Deus não foi levada ao projetor. Posteriormente os slides foram melhor elaborados, transformaram-se naquele folheto que enviei para escola do meu filho e publiquei aqui (Este). Essa mesma publicação acabou transformando-se em um material mais enxuto ainda, que sistematizei na forma de "normas" desejáveis.

Depois disso, Aline Saraiva reapareceu no meu "inbox" novamente em fevereiro deste ano, na ocasião em que retornou à Promotoria de Justiça de Defesa da Saúde Pública por novas preocupações na entrega do Neocate. 

Em paralelo, aquela Audiência Pública no fim do ano passado já tinha gerado frutos. O Conselho Municipal de Educação começava a discutir sobre um anteprojeto de resolução para regulamentar as problemáticas abordadas ali. Compareci então, novamente com Aline, ao gabinete da Toinha Rocha e deixei com o Rodrigo aquele documento que formulei, com as normas desejáveis (veja documento AQUI). Em seguida, seguiu-se um debate e, por fim o Ante-Projeto da Resolução estava editado e foi lançado à votação, neste dia 12 de março de 2014.

Importante também foi uma conversa que tivemos neste mesmo dia pela manhã, eu, Aline e Bruno Feitosa, assessor da Célula de Alimentação Escolar da SME (Secretaria Municipal de Educação) de Fortaleza (administração PSB - lembra que mencionei que ela intervinha em todo tipo de partido?), onde tivemos a oportunidade de um diálogo muito positivo, pelo teor das informações que conseguimos transmitir e principalmente pela receptividade e acolhimento de todas aquelas informações. Fiquei feliz com o engajamento que vi no Bruno, senti esperanças de ver nossas propostas beneficiando as crianças do ensino público em Fortaleza. Surgiu o convite de conversarmos com o setor de Arquitetura e Engenharia, para adaptações e novos projetos de cozinhas "alergicamente corretas" e também para participar de uma reunião com  a nutricionista no dia seguinte, para ver a possibilidade de adaptação de cardápio.

Logo mais, por volta das 14hs começava 72º Reunião Ordinária do Conselho Municipal de Educação de Fortaleza, com dois assuntos: o primeiro sugeriu correções na Resolução que dispunha sobre inclusão de estudantes com deficiências, Transtornos Globais de Desenvolvimento e altas habilidades/superdotações; e o segundo tema, que começou aproximadamente as 16 hs, analisou, discutiu e APROVOU o Anteprojeto de Resolução que dispunha sobre a obrigatoriedade da matrícula e da alimentação escolar adequada para estudantes clinicamente considerados celíacos, diabéticos, com alergia ou intolerância alimentar e outras patologias congêneres nas instituições educacionais públicas e privadas do município de Fortaleza. E como representantes de nós mesmas mães, estávamos: Rodrigo Medeiros (como sempre), Aline Saraiva, Sued Mara e eu. 

O que posso dizer desse dia: Não foi enfadonho ouvir falar dos problemas dos autistas antes do nosso, não tive medo de falar o pouco que manifestei quando me coube, não polpei palmas para celebrar o desfecho da resolução, e por fim, não segurei as lágrimas quando Rodrigo me cumprimentou usando de algumas palavras que me trouxeram um filme "the flash"...ele disse "Eu nunca esqueço que você, naqueeela época, já falava dessas questões...com seu filho..." 

E realmente, há quanto tempo! Em segundos, me vi com Danilo aos 2 anos numa mesa rodeado de crianças da mesma idade, onde os outros comiam pão de queijo e curiosos tentavam mexer no lanche sem leite que meu filho comia...e a professora que tocava nele depois de entregar o sanduíche de queijo para outra criança... me vi indo embora daquela escola, sufocada em tanto leite, levando comigo meu filho em suas únicas duas semanas de infantil 2... me vi em lágrimas na sala do diretor...Me vi rapidamente na escola seguinte, no ano seguinte, olhando Danilo por cima do muro lanchar numa mesa de uns 12 lugares, mas sozinho cercado de muitas cadeiras vazias, enquanto a outra mesa, na outra ponta do salão, reunia sua turma completa...me vi algumas dezenas de vezes na sala da diretoria, pelejar nas mesmas pendengas de sempre, ora com psicóloga, ora coordenadora, ora diretora...me vi separando marmitas de brigadeiros pra ele levar nos aniversários de sala de aula... me vi na porta da sala, fim do turno, vendo passar por mim uma coleguinha, duas, três, todas com pacotinhos enfeitados cheios de mimos e guloseimas, e Danilo de mãos vazias: minha mais cruel ferida deste dia quando, só ali em setembro, descobri que por todo o ano letivo, em cada aniversário de aluno, ele era o único que não recebia a lembrançinha... 

Como não me emocionar de saber que aquela resolução, primeira na história do país a contemplar este tema, acontecia ainda a tempo de beneficiar meus dois filhos.

Dentro de alguns dias, ela deve ser publicada. Ainda não temos o texto disponível, mas basicamente trata de abrangências, nada específico demais, ele talvez até esteja sujeito a alguns escapes, pois não amarra o cuidado com os traços de forma tão rígida como tem que ser, mas já atende muito bem àqueles que toleram traços, e promete ser a introdução para maiores vitórias.

Certamente, as escolas públicas e privadas dessa cidade, começarão a enxergar a Alergia Alimentar e temos aqui conquistado:
  • a seguridade da matrícula;
  • a seguridade em podermos optar por levarmos a alimentação de casa;
  • a seguridade de termos nossos filhos inclusos nas atividades curriculares e eventos comemorativos.
Finalmente, termino essa publicação com um outro material que enviei ao Setor de Alimentação Escolar da SME de Fortaleza, que afinal ficou interessante. Aqui vou apenas omitir os itens que fazem parte do cardápio, por que não sei se essa divulgação estaria autorizada. Mas no documento enviado, assinalei as refeições que mereciam adaptação, e logo em seguida fiz uma proposta de produtos de substituição e, por fim, um layout do que seria essa cozinha perfeita. (Link AQUI).


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